Foi assim que ele chegou: sorrateiro e calado. Veio lentamente, se encostou devagar no ombro de Lia, olhou-a com seus belos olhos, sorriu com seu largo sorriso.
Ela hesitou um pouco. Ficou reticente, com medo do que viria. Olhou de soslaio, na noite escura, em meio a tantas pessoas. Talvez assim ele não percebesse e ela poderia ver se aqueles olhos eram olhos de quem lhe queria mesmo. Foi um intrigante jogo de olhares. Ela não esperava. Mas queria olhar mais. E olhou.
Na cozinha, Lia percebeu a surpresa diante da sua presença. Ficou feliz. Ele lhe ofereceu uma taça de vinho convidativa. Entre amigos, conversaram sobre os grandes amores. "Um dia eu quero viver um grande amor", disse ele. Ela achava que já tinha vivido o seu. Mal sabia que ele ainda estava para chegar. E com tanta intensidade que a deixaria extasiada, paralisada, com medo e desejo.
Levantou-se da roda e foi para aquela varanda. Encostada no parapeito, olhava para o nada. Aquela imensidão escura, onde a água se confundia com o céu e se misturava com o cheiro de mato. O que havia mais à frente não dava para saber. Dava até medo. Ela ficou ali, esperando o que aconteceria.
Logo ouviu passos e viu um vulto descontraído, com uma garrafa de vinho na mão. Uma cena inesquecível, de tão esperada. Conversaram amenidades, sempre a uma distância respeitável. Lia não se lembra de tudo o que conversaram. Mas se lembra bem da sensação. Uma sensação que há muito não sentia. Um misto de medo, emoção, paixão, desejo. Minutos longos e belos. Quando se sentaram na beira do rio, ela nem sabia o que pensar. Muito menos o que fazer. Os minutos de silêncio eram intermináveis. Olhos se mirando, mirando na boca, mas mãos.
Um rápido desvio e as bocas se encontraram. Um beijo desengonçado, como quase sempre são os primeiros beijos, mas cheio de desejo. Depois, não sabia o que dizer. Até hoje não sabe.